Thursday, March 27, 2008

 

Olivia Byington (Para J. Carlos Muniz Lacerda)


Algumas resenholas já foram feitas e loas tecidas à essa grande chanteuse, compositora e filósofa musical carioca, Olívia Byington, que nunca é midiática. Mas como até diz no seu grande sucesso de fim dos 70, eu friso que ela anda com luz, iluminando o “lado escuro onde a vida continua”. Esse pocket show dela, que de bolso não tem nada, pois é enciclopédico, é uma verdadeira auto-biografia no palco. Uma coisa muito melhor do que se tivéssemos uma Laurie Anderson menos aditivada e meio acústica. Moleza. Como filha do junguiano Carlos Byington, ela mesmo confessa o papel da simbologia nos seus passos pessoais (e diria que musicais). O arrojo do arranjo exemplifica o jogo de esconde-esconde.....

O show combina uma magistral espiritualidade (o mantra inicial aos vedas e o seguinte estilhaço de harmo-melodias de uma canção de Gil louvando Nossa Senhora é a perfeita modernidade nem pós, nem pré... Ou contendo ambas, o que a torna inteira). Com um bom gosto que não vou adjetivar pois teria que usar um palavrão enorme e lindo para qualificar a obra dessa mulher. No melhor dos sentidos, obviamente. Uma vez, Abel Braga, o técnico campeão do mundo pelo Internacional do Veríssimo, ao ver o Felipe, ex-lateral do Vasco num dos seus dias desconcertantes disse: “Vai jogar assim....”

Assim é Olívia. Vai cantar assim... Vai compor assim... Mas, começando pela voz. As oitavas ainda estão lá em cima, registros além da lua. Não houve uma metamorfose como Joni Mitchell, com o registro mais baixo. Noel, Egberto, Caetano, Tom, A Barca do Sol, letras de Geraldinho Carneiro, Yves Montand, Seu Jorge, Pablo Milanés e ela mesmo. Só faltou Radiohead, mas ela escutará sem dúvida. Fará parte do seu show. Suas desconstruções de Caetano e fidelidade ao ideal jobiniano são indescritíveis. Menos, menos, menos. “Understated....” Muito bom gosto, cultura, identificação com a dissonância, diminutas e finalizadas de arpeggios, volta e meia (meia volta vamos dar, e ela dava sempre).

Esse show para quem quiser acessar seu site pessoal no MySpace está todo lá com várias noites na Sala Baden Powell por vir ainda (eu vi no Centro Cultural Carioca - magistral a escolha!) e em turnê inclusive internacional. Seu último disco autoral saiu com participação até de Bethania, pela Biscoito Fino. Já é hora da mídia jogar o spotlight a quem é de direito. Todas as letras, menos uma creio, do poeta português Tiago Torres da Silva, com um vernáculo e dicção absolutamente “brasilairas”, o que torna a empreitada ainda mais valiosa. Brasilairas com Tom de Abelaira.

Mas voltando ao show em si, é um passeio por sua vida, formação entre tertúlias com Morelembaum e Egberto, uisghe beata com Paulo Mendes Campos e Sabino, contando com letras de calibre de alto teor teórico. Na melodia, influência de Tom; junto a vocalises e cantatas eruditas que dão um alô, alô em cada uma de suas canções ou leituras. Engraçado como o material solo antigo ainda está super fresco. Com as sacadas e janelas abertas do CCC, no fim de Lady Jane, como que por inspiração divina, sinos da igreja próxima repicaram, isso tarde da noite. Leituras de Aracy de Almeida. Leituras sobre amor, desencontros e desenganos de sublime altivez.

Um dos shows e propostas mais interessantes, arrojadas e criativas destes tempos atuais. A platéia fica mesmerizada. Os “sonados” despertam e os inquietos se pacificam com essa voz angelical. A Nélida Piñon disse que se Machado existe, o Brasil tem jeito. Eu sempre fui fanático e falo aqui despudoradamente. Se ela existe, existe um Brasil do cacete! Já fiz uma aula de expressão corporal com a diva e já a encontrei na praia em longínqüos anos falando que tinha dado – naquele tempo – uma fita cassete da "ouvre" prum japonês roommate no exterior e que propaguei um pouco da chama. Não sendo sibarítico e não devendo nada a ninguém, tenho acompanhado toda a obra, até nos hiatos e silêncios. Como tiete, recomendo.... Como fã que conhece tudo faltou: “O cravo, a crise, o crime, nas barbas da polícia....” Acho que seria super atual. Sempre com o Geraldo Carneiro.... Outro Lamb, Outro Mouton, mas de outras pastagens.....


Deixo aí uma palinha da letra – editada - do seu parceiro na última empreitada, mas feito para e com Jorge Peixoto. Ele está em

http://cancoesdotiago.blogspot.com/


PRA NÃO TER MEDO
(Letra: Tiago Torres da Silva/ Música: José Peixoto)
sabes de que é feito o silêncio?
sabes de que é feita a saudade?
onde é que nasce a voz do vento?
porque é que esta dor me invade
(porquê o silêncio? porquê a saudade?)
quando se apaga uma estrela
diz-me quem veste um véu de luto?
quem é que vai chorar por ela?
quem se vai calar um minuto?
meu amor, sabes que há um livro
que ninguém é capaz de ler?
só se vive
por desejo
de o escrever
nunca de mim saberei
se algum dia lá escrevi
a saudade um dia contou-me
que a minha vida é um segredo
a que eu escolhi dar o teu nome
pra não viver morta de medo
E ela em:
http://www.myspace.com/oliviabyington

Comments:
Obrigado pela generosidade comigo e com a Olivia que eu também admiro há muito tempo!
acho este show de uma delicadeza incrível e foi emocionantíssimo vê-lo em Lisboa há pouco mais de um mês. espero que agora o público carioca lote a sala baden powell porque o show, a Olivia, o Brasil merecem!
grande abraço de Lisboa:

tiago

Ps: só um pequeno reparo, não é jorge peixoto, é josé peixoto! um dos maiores guitarristas portugueses, membro do "madredeus" e meu parceiro em muitas canções, esta está num disco que fizémos com a cantora Maria João que também é um estrondo!
 
Tiago, obrigado pela generosidade e ERRATA total, eu adoro Madredeus.... Fica corrigido entonces. Abs. Lamb Mouton
 
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