Thursday, July 27, 2006

 

Lion of Judah Sayeth....

The U.S. is in need to throw Prozac in the water supply. Where is Daniel Barenboim when we need him? An eye for an eye, everybody gets blind... Tooth for a tooth, and the dentists will laugh it all the way to the bank....

This thing ain't going nowhere. Try bycicles and bring the boys and girls back home. The worst thing is to see the short-haired youth genuflecting before the altar of the almighty dollar. Not the new idealists that do not know how to read, but those shaking to the 80's.... Now grown-up, somehow, not a single Sandinista in the crowd, not knowing about what Hayek really meant....

Carry on....

The irony is that Israel was the only socialist experiment that worked...

A Haitian ideological divorce of sorts... When Papa said, no tears, no heartbreaks and no remorse....

Wednesday, July 26, 2006

 

Na Baixa do Sapateiro de Madeira

DE OUDE KERK, AMSTELKRING, AMSTERDAM;
ONZE LIEVE VROUWE KERK, HEILIGBLOED BASILIEK, BRUGGE
E OUTROS TEMPLOS CRISTÃOS DE FLANDRES E HOLANDA

Gurdjieff falava de uma arte objetiva, que tocaria exatamente da mesma maneira a sensibilidade de quem quer que a observasse. Um exemplo de obra desse tipo seria a Notre Dame de Paris, e outras catedrais góticas. Seriam veículos de um conhecimento psicológico, verdadeiros livros em forma arquitetônica. Interessante pensar nisso quando comparo as diferentes reações que tive a duas catedrais góticas exteriormente semelhantes, a Oude Kerk, a velha igreja (de 1250) de Amsterdã, e a Igreja de Nossa Senhora, a Onze Lieve Vrouwekerk de Bruges, Bélgica.

Ambas têm a mesma arquitetura tipicamente gótica, o pé direito altíssimo, os vitrais característicos e as majestosas arcadas ogivais, imensas, que nos fazem sentirmos pequenos, num mundo onde o Altíssimo impera, solene. Algo, porém, as diferencia. De Oude Kerk fica meio deslocada, dessacralizada numa cidade protestante, não mais um templo de adoração, mas um museu a mais, simples ponto turístico; a rua em que está, a Oudezijds Voorburgwal, é hoje a principal artéria do vibrante, pulsante e latejante bairro da Luz Vermelha, o bairro dos sex shops com seus mil e um gadgets eróticos e das prostitutas oferecendo seus serviços nas vitrines como uma mercadoria a mais, sem falar nos Bulldogs e outros bares pra fumar uns muitos de todos os tipos, enfim, algo assim como uma Prado Júnior batava, A Velha Igreja templo esquecido nesse antro de perdição, que ela não eleva nem redime, e, que, ao que parece, ninguém condena, está mais para um plágio de si própria do que para verdadeira imersão no pecado, versão pervertida e turística de um desejo de liberdade, que algum dia se expressou de um modo próprio, real. Está vazia e quase morta a velha igreja neste fim de tarde de inverno holandês, com uns poucos turistas desanimados e recepcionistas com pressa de a fechar.

Outra é a sensação que tive em sua quase gêmea arquitetônica, a Onze Lieve Vrouwekerk de Bruges, construída também no século XIII nessa que foi a primeira grande cidade do capitalismo, chegando em seu apogeu a ser mais populosa que Londres, com sua manufaturas de linho no entroncamento das rotas do comércio ainda incipiente, mas que nos tiraria do torpor em que o mundo mergulhou desde a vitória de Alarico e seus Bárbaros Caps e da queda do Império Romano do Ocidente, Bruges que brilhou até entrar em decadência quando o Zwin, que a ligava ao Mar, assoreou e deixou de dar passagem aos navios, no século XV, mergulhando depois num longo abandono de que só sairia no século XIX, para depois sobreviver, como hoje, basicamente do turismo. De interior igualmente sóbrio e hierático como são os templos góticos, tem entre seus destaques uma Madonna com o Menino Jesus de Michelangelo. Não sei se porque quando cheguei lá o som na caixa eram magníficos hinos gregorianos, se porque o país é católico e a Igreja está viva, mas me emocionei profundamente, viajei na trip cristã gótico-medieval do temor a um Deus onipresente e onipotente, que tudo vê e que humilha o homem pretensioso que quer ser mais que Ele. De alguma maneira somos transportados para um outro tempo e para outras esferas, mais sagradas, nessa Igreja dessa cidade que também parece ter parado na Idade Média, paraíso comercial e religioso de uma próspera burguesia e um capitalismo nascente, com seus imponentes Burg e Mart, grandes praças com imensos prédios que eram o centro da vida da cidade quando grande centro comercial, cidade essa que guarda, na Basílica do Sangue Sagrado, uma relíquia do que seria o Sangue de Cristo, até hoje guardado com zelo por uma fiel Confraria.

Também há prazeres mais mundanos, chocolate quente servido por magras e altas garçonetes jovens e lourinhas, passear nas ruazinhas estreitas dessa que é como uma Ouro Preto do Primeiro Mundo, tomar as muitas cervejas locais de diferentes tipos num bar onde do nada surge um belga que começa a conversar conosco, eu misturando holandês, mau alemão e péssimo inglês, porque os flamengos se recusam a falar francês, só que apesar de eu ser Mengão o PlattDeutsch deles não é muito a minha, diz que a melhor cerveja belga é a Leffe, peço uma marrom, bruin, digo que gosto também da loura Hoegaarden e das feitas por monges trapistas, além da Duvel, ele discorda, pra ele a Leffe não tem pra ninguém, mas o barato mesmo é pensar na força do Cristianismo nesse lugar que é de outra Era, que sobrevive como se vindo diretamente de um passado muito distante, e ao mesmo tempo parece, nessa Igreja, além de todo tempo.

De certa maneira, mesmo no Museu Amstelkring a emoção é maior que na Oude Kerk. Também erigido (ou seria ereto ?) na Prado Júnior de Amsterdã, ele foi uma das poucas igrejas católicas clandestinas do tempo das guerras religiosas que sobreviveu. Nessa época de lutas de fé, o eterno espírito de tolerância neerlandês acabou chegando a uma solução de compromisso, como faz hoje com o “tóchico”, e os protestantes permitiram que os católicos continuassem a manter suas igrejas, desde que não tivessem sinais exteriores, não tocassem sinos etc. Muitos então fizeram igrejas de suas próprias casas, e essa foi a única que permaneceu até os nossos dias, a Ons’ Lieve Heer op Solder, a Igreja de Nosso Senhor do Sótão, onde ninguém vai chegar para a missa de domingo, é só um museu, mas é como se a qualquer momento os fiéis pudessem subir as escadas do estreito prédio e sentarem-se nas acanhadas cadeiras do sótão para louvar o Senhor à sua maneira, que lhes é tão cara: pois está tudo lá, o altar indefectível, imagens de santos, turíbulos, todos os fetiches pios da fé que os iconoclastas de Calvino, Lutero e Huss baniram, até mesmo um acanhado confessionário. Os sinos não dobrarão por ninguém, pois todos já se foram, nenhum carrilhão anunciará, orgulhoso, a boda de um casal ansioso, mas feliz, a Páscoa ou a Noite de Natal, nenhum badalo: mas é como se a congregação aqui de novo se reunisse, hoje e sempre, eternamente reunidos na sua fé, como se, teimosos, aqui voltassem para insistir em que também o Espírito precisa encarnar num corpo, porque a carne é necessária, quanto mais não seja para que o Verbo possa se fazer carne, e, assim, espiritualizar a matéria, o sutil descendo ao mundo grosseiro para depois elevá-lo na Glória, como o Filho Unigênito que o Senhor enviou a este mundo imundo para nos salvar, o Cordeiro de Deus que andou entre os lobos dos lobos dos homens e padeceu sob Pôncio Pilatos para tirar o pecado do mundo, cortou de sua carne e verteu seu sangue na Santa Ceia, no Mistério da Eucaristia, pedindo aos Apóstolos e a nós que por daí em diante sempre o fizéssemos, em memória Dele, que morreria na Cruz para nos salvar, ou mesmo a vela de que falava Teilhard de Chardin, feita de sebo vagabundo e barbante barato, mas que, acesa, mesmo assim pode conter a Luz, porque a Luz está em todo o lugar. Talvez para alguns não haja comunicação com o divino senão pelo cumprimento estrito desse ritual, pelo respeito fiel à hagiografia, pelo culto das imagens de fé: é pela matéria que tocam o espírito, pelos sentidos que roçam o inominável e o indizível, essa é a língua em que com Ele falam. Por isso, às vezes mais vale um sótão onde se podem celebrar cultos do que toda uma Catedral que só como estátua se conserva. Não surpreende: é lá que sua religião está viva, que Deus, diretamente, lhes fala. Muitos são os caminhos, mas só uma a Verdade: a casa do Pai tem muitas moradas, e seu Filho lá nos prepara lugar — pois quem n’Ele crê não morre, mas vive para a Vida Eterna. Amém. Regozijai, rejubilai-vos, pois, irmãos.

 

Curitibeato

CU-RI-TI-BA LEI-TE QUEN-TE

A fala das pessoas é escandida assim e as meninas têm uma deselegância nem tão discreta, o povo é um outro povo, fisicamente europeu e mentalmente caipira ao mesmo tempo, há lojas que vendem selas e cuias de chimarrão em pleno centro, curioso que a erva-mate é daqui e só depois foi exportada para o Rio Grande, Uruguai e Argentina, o mundo gaúcho Far South — que é o nosso Faroeste, sem petróleo mas com caubóis dos pampas, presidentes da República e civilização — que Curitiba já anuncia, bons shoppings, o bairro Batel que é uma espécie de mini-Ipanema, a impressão geral que tive foi de uma Belo Horizonte melhorada, um boa cidade média brasileira, com vida equilibrada, sem aquele glamour cosmopolita do Rio sempre voltado para o exterior nem a febre do capital financeiro paulistano ou o barroco da negra Salvador e seu imenso Elevador Lacerda, sobrenome que sempre aspira a grandes coisas, ponte entre dois mundos, marcada pelo passado com suas igrejas e monumentos, o Pelourinho, toda uma grandiosidade a que um dia se aspirou e que aqui e ali ainda se encontra. Curitiba se contenta em ser uma cidade média, sem grandes sonhos, sem delírios de grandeza, apenas uma cidade para se viver a vida, a vidinha comum de classe média, mediocridade feliz simplesmente. Chega a ser risível a reclamação dos taxistas sobre o aumento do número de assaltos, um povo educado demais, perguntam se estamos servidos quando acabamos de comer e dizem disponha em lugar do nosso de nada ou do abominável paulistano imagina. Curiosa essa combinação de provincianismo e internacionalidade, a composição étnica é muito diferente, Salvador tem mais negros que o Rio mas isso não nos chama tanto a atenção, ao contrário, é a profusão de louras ucranianas que espanta, mesmo o motorista de táxi descende de cossacos de Kiev e nos mostra uma foto dele, amigos, a mulher alemã e os filhos nadando numa cachoeira próxima em verdejante paisagem, surpresa ao ver arianos em ocupações proletárias? Pode ser, mas o fato é que um Brasil muito diferente, quase um não Brasil nos limites de nosso território. Não sei de onde vem a riqueza relativa, além do pólo automobilístico de São José dos Pinhais. Mesmo climaticamente são outro país, uma noite fez quinze graus em pleno fevereiro, no Rio isso é a mínima da mínima se excluirmos o Alto da Boa Vista, algo me atrai para fora daqui desse país com todas as suas nuances senão já tinha feito um concurso pra viver pacificamente lá, eles conservam um pouco de civilização a que o Rio insiste em renunciar, já na ida para o Galeão meu táxi foi o último a passar antes de fecharem a Linha Vermelha por causa da enésima confrontação com a favela, os policiais já começavam a se abaixar pra não tomar bala, até quando resistiremos, mas sei que a crise é nacional, talvez global, não sei se adiantaria, mas começo a ficar de saco muito, muito cheio, e querendo uma vida tranqüila de classe média curitibana, me dedicarei à literatura e meditação prá compensar o tédio, não tem muito o que gastar então derrepa dá pra viajar a Europa todo ano nas férias regulares de funcionário público bem remunerado, ou então até dar uma passada na praia do Posto 9 hospedado na casa dos sogros no verão, ou ir ver a Mangueira entrar na quadra com um americano mulato inzoneiro, um Carneiro faceiro, que Rio é bom mesmo pra turista quando se tem a sorte de não tomar uma bala, e ainda tem muito mais atividade econômica que o resto do país apesar de estar cada vez mais anos-luz de distância de São Paulo, São Paulo, capital, nossa Big Apple tupiniquim, but I don’t wanna make a brand new start of it, um dia ainda vão se ferrar com essa cultura financeira tão entranhada neles que converte tudo e todos à religião das securities como um Midas bursátil, tempo nunca pode ser perdido em diversão e arte porque é dinheiro, tudo tem de remunerar o valor que o acionista empresta mas nenhuma pessoa física sabe ao certo o que fazer com o lucro apurado e distribuído que seja digno de um ser humano, fumar e tossir fumaça de gasolina olha que eu fumo e tusso, terno de vidro costurado a parafuso Papagaio do futuro num pára-raio ao luar, até quando paranaenses, catarinenses e gaúchos vão querer ser parte deste país do futuro do presente do indicativo (ou seria do subjuntivo, o tempo / modo da dúvida ?) e adiar o dia de se separarem de vez, guerra civil, todos contra São Paulo, República dos Farrapos rides again, sempre a tentação de uma solução individual que o Faoro dizia ao Mauricio Dias ser impraticável, ou é pelo coletivo ou não é, meu médico, dentista, ex-colegas jornalistas e atuais colegas advogados todos reclamam que o Rio secou, eu também não sei se qualquer dia não apenas apanharei à beira-mar um táxi pra estação lunar agora que Marte é a próxima parada e as briga pelas paradas aqui já virou guerra incivil.

 

La Buenos Aires del Beato

Bs. As. tem muito a ver com isso. Eu adorei, mas um amigo que morou lá a vida inteira e estava lá visitando a família disse que prá eles tava tudo uma merda, porque confrontam o presente com a imagem que retêm do passado. De fato, até pelo traçado urbano, a cidade floresceu há muito tempo: em sua maioria, as ruas são muy angostas (estreitas), é como se tivessémos uma ou duas ruas do tamanho da Primeiro de Março no meio (depois do Edifício Garagem), como seria as Avenidas Córdoba e Corrientes, com várias Ruas do Ouvidor como transversais, numa época em que esse era o modelo de cidade e, coisa boa, muita unidade arquitetônica, tudo possivelmente construído aproximadamente ao mesmo tempo, quando inventaram o frigorífico e o dinheiro das exportações de carne aportava em peso (com duplo sentido), além daquele proveniente do vinho e do trigo que também são ótimos. Um prédio lembra a galeria Sloper, perto da Anita Garibaldi, em Copacabana, nosso canto de decadência. Foi a melhor relação custo-benefício que podia ter em termos de viagem (até porque uma passagem saiu de graça com o programa Smiles); a carne, divina, a melhor do mundo por causa dos bois do pampa (que caminhavam sem relevo e por isso não ganhavam músculos, ficavam com a carne super tenra), comida quase dada (nos restaurantes em que nego come todo dia, dá prá comer com uma taça de vinho por pouco mais de cinco reais, dois dólares, isso com bife de chorizo), e mesmo os asadores criollos são bem mais baratos que nossas churrascarias servindo carne bem melhor, como o cordero patagónico, o chivito (cabrito) com salsa criolla e chimichurri. Isso além do sabor da língua castelhana na sua versão lunfarda, com italianismos, galeguismos (do qual o excesso de "x", "xô" que é "eu" etc. é uma marca) e gauchismos, o vos criollo que serve para tudo e o onipresente x/j a fazem tão diferente da matriz castelhana com seu seseo, mas é bom não traduzir muito porque senão fica um Brasil em espanhol, quando se lê as notícias fica parecendo demais conosco e aí deprime. Ao contrário de 1976, quando fui pequeno com minha mãe e meu irmão numa excursão, já tem mendigo revirando lixo e menino de rua cheirando cola em frente ao Congresso, na Plaza de Mayo, e gente estranha em parques como o Jardim Botânico de Palermo, mas nada que afaste muito os turistas nem que se compare ao Rio. Uma prostituta com cara de destruída, cabelo louro pintado e minissaia sob 15 graus oferecendo serviços em pleno dia atarefado da carne Lavallle, outra de mais alta classe que me entreolha convidativamente tomando una copa sozinha numa mesa de bar . Muita gente simpática, gostando do Brasil, choferes de táxi melhores em geral que garçons, algumas pessoas agressivas pedindo dinheiro quando se tira foto de lugares turísticos. Muitos lugares que são um retrato do passado glorioso, como a estação ferroviária Retiro que de muitos ângulos lembra a gare du Nord onde se pega o trem prá Amsterdam. A ex-Torre dos Ingleses virou Torre Monumental, e em frente a ela colocaram um monumento em homenagem aos mortos da Guerra das Malvinas, uma chaga no coração do país, perto do Sheraton onde fiquei naquele longínquo ano e que hoje parece uma fortaleza inexpugnável, com barreiras e seguranças mis. Paris é o modelo evidente desta cidade belíssima, que mostra a Europa que podíamos ser e que, pior, um dia fomos e que hoje parece cada vez mais distante, la vergüenza de haber sido y el dolor de yá no ser, a cidade-luz modelo presente até nas grandes praças e avenidas Haussmanianas, porque teremos optado em reproduzir a Europa em vez de criar um paradigma próprio como os EUA? Estará aí a raiz de nosso fracasso, essa fixação numa fase anterior a nossa própria história, a rendição definitiva à condição de exilado em sua própria pátria? Falam (os choferes de táxi, meus principais interlocutores) muito na unidade latino-americana, apesar de tanta nostalgia não senti muito baixo astral, por exemplo, nos locais que dançavam na milonga da matinê de sexta-feira da Confiteria Ideal, onde se misturam aulas prá turistas e dança para locais que bailam fechando o olho de prazer e enlevo, não vi tristeza, mas o mesmo velho prazer que resiste, e não há cheiro de mofo nem no tradicional show no Viejo Almacén, mas o dinamismo de um setor ainda vigoroso, o do turismo. Curioso o dado de que o Cemitério é um ponto turístico, o da Recoleta, vi vários túmulos belíssimos, uma exposição de arte ao ar livre. Os bosques de Palermo são um prazer para se passear, a cidade tem essa coisa ótima que se faz muita coisa a pé, nem saí tanto à noite porque ficava cansadíssimo. Um achado foi Puerto Madero, que revitalizou uma parte abandonada da zona portuária, coisa que o Rio ainda não conseguiu fazer. Uma quantidade inacreditável de livrarias, desde pequenos, bagunçados e apertados bouquinistes até as modernas livrarias com café nos shoppings, só no final vi a mítica Ateneo, one step ahead das nossas Saraiva, com uma organização minuciosa de livros além de uma tradição única que se sente no ar. É bonito e barato o artesanato das feiras como as de San Telmo e Recoleta, mas, é claro, são o ganha-pão da lúmpen-classe média local, que cada vez incha mais com o desemprego crescente. Bons shoppings, o Café Pacífico e o Patio Bullrich, sobretudo para se passear, porque são uma das poucas coisas realmente caras (em termos de Brasil) que se tem aqui. Não fiz um monte de coisas além da noite de não conheci, nem dava tempo, o passeio de barco que sai de Tigre, a Petrópolis portenha, o barco até Montevideo etc., dá prá voltar tranquilo daqui a pouco, recomendo muito, apesar da nostalgia.

 

Salu in Holland

RIJKSMUSEUM AMSTERDAM

Interessante pensar como há momentos na vida de um país em que ele parece florescer, em que tudo nele parece girar num grande círculo virtuoso, numa grande ereção nacional. Foram essas considerações sócio-políticas, mais do que as puramente estéticas, que me assaltaram em minha visita ao Museu Real de Amsterdã, onde vemos, além das grandes obras dos mestres holandeses do século XVII como Rembrandt e Vermeer, todo o retrato da opulência dessa Época de Ouro Holandesa, quando, ao final do séc. XVI, as sete províncias unidas protestantes se insurgiram contra o domínio católico dos Habsburgo espanhóis e formaram a República dos Países Baixos, separando-se, assim, do sul católico, que viria a ser a Bélgica e, separado depois desta, Luxemburgo, feito estado-tampão entre França e Alemanha.

Em cada canto do Museu está bem retratado o fausto dessa Era: as magníficas casas de boneca que fizeram a delícia das ricas burguesas da época — miniaturas minuciosas dos ricos interiores das mansões neerlandesas, mais que brinquedos de criança; uma reprodução de um navio de então; a rica faiança de Delft, imitação bem sucedida da porcelana chinesa, que os grandes navegadores-comerciantes-guerreiros holandeses conheceram; um berço que combina elementos ocidentais, como seu estrado quase gótico, e orientais, como a cabeça do Deus Hindu Ganesha, metade homem, metade elefante, que protege tudo aquilo que se inicia, para que chegue a bom termo _ onde dormiu o bebê de algum dirigente batavo mandado servir em Bengala. Vistas de Olinda de um Frans Post, que há muito já havia retornado à terra natal quando pintou o quadro, saudoso do Nederlands Brazilië, onde, em missão a serviço de João Maurício, o Conde de Nassau-Siegen, e junto com Albert Eckhout, fora o primeiro ocidental a pintar essa assombrosa parte do Novo Mundo, com sua fauna exótica, sua flora luxuriante, seus tupinambás e cafuzos, alguns para sempre selvagens, outros até convertidos à fé calvinista. Magníficos trabalhos em prata, e os muitos mosquetes e espadas desse povo que teve de lutar muito para afirmar sua independência política e a especificidade de sua cultura e religião, o mundo em que acreditavam, em que a autonomia, o empreendedorismo, e a tolerância religiosa eram os valores dominantes.

Fica claro que o que contemplamos não é só o fruto de cérebros privilegiados, mas antes a expressão de um movimento que tomou conta de toda essa parte do Ocidente nessa época: a fervorosa fé calvinista, que ia de par com uma mentalidade de livre iniciativa e abertura para o diálogo: que criou as primeiras sociedades anônimas, essas “máquinas jurídicas” como as chama Alfredo Lamy, que junto com Bulhões Pedreira redigiu o anteprojeto de nossa Lei das S.A., onde todos podiam ações das duas primeiras companhias abertas da história, as Companhias das Índias Orientais e Ocidentais. Embora fossem sociedades de economia mista, porque delas o Estado também participava, a subscrição dos papéis de sua emissão era um investimento altamente rentável, e por isso mesmo bastante popular, ao alcance de cidadãos comuns, tendo proporcionado retornos de 40% sobre o capital investido a alguns afortunados, cujos filhos puderam fazer carreira nas artes, livres das preocupações com a sobrevivência. Para lá acorreram muitos, para fugir de perseguições religiosas ou simplesmente fazer dinheiro, sobretudo aqueles do menos afortunado sul da região, ainda preso ao atraso católico ibérico, mas também huguenotes franceses e judeus sefarditas como os portugueses Isaac de Pinto, cuja mansão, a PintoHuis, é até hoje atração em Amsterdã, assim como a Sinagoga Portuguesa, lugar de adoração de uma comunidade que teve como seu membro mais famoso um filho de judeus com um nome tão tipicamente lusitano, Bento de Espinosa, que escreveria uma das obras filosóficas centrais até hoje, a Ética à Maneira dos Geômetras. Não tivessem seus pais fugido para a Holanda, e talvez Baruch Spinoza fosse ser ourives no Recife, abrir uma padaria em Salvador ou morrer nas fogueiras da Inquisição jesuítica. Em vez disso, foi prolífico, frutificou numa terra fértil para o pensamento, que por primeiro se tornou coisa pública, res publica num tempo de reis e rainhas absolutos (pois só depois o Lord Protector Oliver Cromwell faria na Inglaterra sua Revolução Gloriosa), alguns ainda feudais como os reis portugueses e sua corte de asseclas, tudo extraindo do Estado que viam como seu quintal, do qual podiam por e dispor, limitando-se a comandar os servos que deveriam se contentar em os bem servir.

Na luta por sua afirmação nacional, brigaram tanto os holandeses que acabaram perdendo sua preeminência, ficando atrás dos ingleses e franceses com quem tanto guerrearam, mas suplantando em muito seus antigos conquistadores ibéricos, aliados por laços dinásticos aos Habsburgo austríacos, que permaneceriam sempre um pouco à sombra das grandes transformações até que o Arquiduque Franz Ferdinand fosse assassinado em Sarajevo e desse início à Primeira e à Segunda e à Terceira Guerras Quentes e Frias Mundiais. Graças à ação dos holandeses, bem como por obra dos desmandos castelhanos na União Ibérica que se seguiu ao desaparecimento do Rei D. Sebastião em Alcácer-Quibir, Portugal perderia grande parte de seu império do Ultramar, ficando reduzido à colônia americana e às africanas, e a um e outro entreposto na Índia, China e Indonésia, com seus nomes que parecem interjeição de piada de português, Goa, Diu, Damão, Dili, Macau. Mesmo a América Portuguesa foi ameaçada, como se sabe, com o Brasil Holandês que teve sua capital em Olinda, mas que se estendia até o que hoje é o Maranhão. Um Brasil singular, mais urbano que rural numa época de plantação de gêneros tropicais em fazendas imensas, para a exportação e riqueza logo dissipada de seus donos, que apenas embolsavam o lucro conquistado com o suor do trabalho escravo, que também lavrou o ouro das Minas Geraes que a tributação escorchante logo confiscou, para depois entregar de bandeja de prata aos britânicos, colonizadores do colonizador, a quem deram guarida em sua desabalada carreira em fuga dos exércitos napoleônicos.

O resto é conhecido mesmo por quem não leu o Rubro Veio do Evaldo Cabral de Mello, irmão do João Cabral de Mello Neto, nem o Calabar do Chico Buarque de Hollanda com dois lls. Em Guararapes o sonho do Brasil Holandês acabou, nunca mais Pernambuco Paraíso Protestante, para sempre perdido nos tristes trópicos, abandonados à triste sina e o melancólico e deprê fado lusitano, novamente livre do jugo de Castela e seu flamenco feroz do qual sempre fugiram, o mar é a única sepultura digna de um almirante batavo, a maioria retornou à Holanda e alguns, judeus inclusive, fugiram para as Antilhas levando cana que plantaram com mais inteligência (aproveitando o bagaço como combustível, em vez de torrar madeira de lei para mover a moenda como aqui) e, mais ao Norte da América, fundaram Nieuuw Amsterdam, em torno da qual construíram um muro para se protegeram dos índios Manahata, e, perto dali, como na Holanda, fundaram Haarlem, que é uma espécie de Búzios de Amsterdã, cidade menor e mais próxima do Oceano. New Amsterdam se transformaria em New York, New York, I wanna be a part of it, a rua do Muro, Wall Street, no Harlem floresceria o jazz e onde um dos presidentes americanos mais populares abriria seu escritório; inspirado no Benelux (Bélgica, Holanda, Luxemburgo, países que acabaram reunindo as antigas sete províncias protestantes e mais as dez católicas), surgiria a Comunidade Européia, que acabaria por soerguer até mesmo os antigos padrastos da Península, reunindo-os à Europa e à vanguarda da História, a ponto de tentarem um pouco até nos recolonizar com a mesada que receberam. Mas essa já é outra estória.

Mais tarde, na ReinassanceZaal de Brugse Vrije, em Bruges, Bélgica, eu veria, ao lado de Carlos V e dos diversos soberanos do período, o retrato familiar de um rei louro, que eu já vira na exposição dos pintores espanhóis do século XVI do MNBA do Rio de Janeiro: sim, era ele mesmo, Felipe II, que um dia reinou sobre Espanha, Portugal, Algarve e o que hoje são os três países do Benelux, esse pioneirismo mais uma prova da flexibilidade típica dos que estão abertos e atentos para responder às exigências sempre novas de uma vida que muda a cada momento, e mereceram por isso sediar, em Bruxelas, a Comunidade Européia, e em Haia, a Corte Internacional de Justiça, civilizadíssimas manifestações de povos que perceberam que a mesquinha soberania absoluta não dá mais pé num mundo transnacional, onde as soluções têm de ser supra-estatais. Sim, algum dia estivemos sob a mesma coroa, mas eles conseguiram se libertar desse soberano atraso, enquanto nós ficamos presos ao passadismo ibérico, já fora de época nesse mundo onde já se anunciavam as evoluções técnicas que redundariam no Capitalismo Industrial, que mais tarde suplantaria o Capitalismo Monopolista da plantation e do trabalho escravo, no qual a metrópole se limita a sugar colônias para lucrar vendendo caro o que produz barato, sem se preocupar nunca e produzir sempre mais e melhor, e se estabelecer no local da produção para comandá-la, fugindo da concorrência e da competência, deitando-se eternamente em redes psicológicas de uma preguiça crônica, refestelados para sempre em berço esplêndido, limitando-se, pachorrentos, a mandar fazer, a ordenar que outros e lavrassem ao sol inclemente, para explorar até a exaustão a terra tão inocente e generosa, na qual daria tudo o que se plantasse, destruindo sucessivamente a cana, o algodão, o tabaco, o ouro, diamantes, borracha e café, queimando o solo até torná-lo estéril como suas mentes, sem nunca se preocupar em adquirir know-how para produzir mais e melhor e sempre, ao contrário, condenando a negrada à sua própria estultice, quando não a matava de porrada, fome, ignorância e sexo forçado, buscando sempre se esconder do trem da história atrás de seus Pirineus geográficos ou mentais, na vã guarda do atraso.

Nossos distantes irmãos dos Países Baixos sofreriam algum baque com suas derrotas para ingleses, franceses e alemães, mas depois se reergueriam, e mesmo os belgas, embora continuando católicos, se transformariam em quase uma potência, apesar dos desmandos do Rei Leopoldo no Congo, que transformou em sua fazenda, o Zaire de que Conrad e Marlon Brando nos deram notícia, Apocalipse Now e sempre, lembrado hoje só por uma Kinshasa onde o imã Muhammad Ali deu um baile no pastor Foreman, e pelo terceiro gol da Valdomiro na Copa de 1974, “fingi que fui, não fui e acabei fondo”, e a última flor do Lácio se fudendo, inculta certamente, mas duvidosamente bela.

Ainda hoje, a Holanda, com seu ABN-AMRO Bank e sua Philips são o terceiro maior investidor no Brasil, e graças ao Rei Alberto da Bélgica foi fundada (para lhe dar o título de Doutor Honoris Causa) nossa primeira Universidade, a Universidade do Brasil e do Rei Alberto, monarca que Drummond (nome que vem do neerlandês arcaico “alta onda”, segundo o próprio) cantou em poema, Rei Alberto que muito se admirou com a sabedoria simples do Jeca Tatu, e cuja mulher virou nome de rua na divisa de Copacabana com Ipanema, a rua Rainha Elizabeth (da Bélgica, embora muita gente pense que é de sua homônima inglesa), não muito distante da leblonina Rainha Guilhermina, Koningin Wilhelmina amada de seu povo, tão firme na resistência contra os nazistas. Hoje, Flamengo é só o nome de meu time, o da camisa rubro-negra como duas das cores da bandeira tricolor belga (que tem ainda o ouro que os portugueses levaram daqui), nome esse que homenageia o bairro onde alguns filhos de Flandres se estabeleceram nos primórdios do Brasil-Colônia; o Maneken Pis de Bruxelas é só uma estátua na Praia perto de casa, e o símbolo do time rival que homenageia outro bairro. Holanda e Bélgica são apenas fotos no álbum de família, ou um retrato na parede — mas como doem!, sobretudo quando pensamos que talvez estejamos condenados a sermos sempre o país do futuro, um futuro que insiste em nunca se tornar presente, um povo perdido em seu Sebastianismo sem Sebastião, que jamais virá de Alcácer-Quibir alguma, os mouros venceram e já começam a se articular na Tríplice Fronteira que nunca será o triângulo do sexo ardente ou o orgasmo múltiplo masculino dos taoístas, e sim o eterno ocaso da América Católica Latrina do Mundo, pobre Extremo-Ocidente, filho reprimido e enjeitado da brochura careta ibérica.

Penso em tudo isso agora como pensei lá, enquanto via os quadros, até a hora em que meus olhos por último se fixaram na menina com brinco e turbante e na criada a despejar leite de Vermeer de Delft, retratos de um quotidiano registrado para a eternidade, flagrantes de um momento tão comum, mas que simultaneamente nada tem de banal, revelando-nos um dia de outro tempo, num instantâneo que é toda a eternidade. Os guardas do Museu nos avisam que está fechando, temos de ir embora, meus olhos úmidos se fixam num dos muitos detalhes da pintura de um pão que há muito já virou fungos dispersos no ar, mas cuja imagem bidimensional é mais real que os guardas e os velhos visitantes do museu, que um dia, como todos os homens, desaparecerão com sua tridimensionalidade vã e sua carne que será o alimento dos vermes, enquanto as imagens que os mestres viram e pintaram permanecerão, em memória deles e de seu grande país, mas também como um retrato da consciência, da vontade, de tudo o que mais pode o espírito humano, momentos de perfeição que são também fiéis retratos da realidade, instantâneos objetivos e puros da Verdade, que se eleva acima de toda ambição pessoal ou nacional, o divino encarnado que, quando apreendido, é a expressão da glória, ao mesmo tempo em que a transcende, além do ego, além de tudo, puro silêncio, vitória do Espírito que a um tempo afirma e nega a opulência material que, de certo modo, tornou possível sua manifestação, plenitude da imanência que facilita a transcendência, furor erótico que, satisfeito, se converte em fervor místico, corpo e alma, transubstanciação. As portas do RijksMuseum se fecham. Seis da tarde é alta noite no inverno batavo. Brilham as pedras brancas do jardim do Museu Real. Cai o pano.

Monday, July 24, 2006

 

Beato Salu Mitterrand

O ÚLTIMO MITTERRAND

Por Beato Salu

"O Último Mitterrand" (Le Promeneur du Champ de Mars), de Robert Guédiguian, baseado no livro homônimo de Georges-Marc Benamou, é pluridimensional: idéias, biografias auto e hetero, a vida privada dos homens públicos, a intersecção entre indivíduo e História, os (des)caminhos do socialismo e a falta de alternativas ideológicas na globalização, ecos de Lear ou Henrique V e os detalhes nada Shakesperianos da inautocrítica e da decadência física de François Mitterrand, presidente da França entre 1981 e 1995, um pouco de tudo num filme que interessa mesmo a quem não souber tudo sobre a história recente da França.

Indicado do Festival de Cinema de Berlim de 2005, não foi tão bem recebido pela imprensa internacional. Mitterrand (Michel Bouquet, grande, grandioso), no round final contra um câncer na próstata, está nos estertores de uma luta, se não contra o esquecimento, ao menos por sua auto-imagem. Tenta aliciar o entrevistador para sua busca por fazer com que a França conserve dele uma imagem de estadista comparável a seu improvável (mas alegado) amigo De Gaulle. Esquiva-se repetidamente de comentar sua colaboração com o regime de Vichy e seu suposto anti-semitismo, e não chega a sofrer o golpe de ter de comentar sua coabitação com os partidos de direita e a expulsão dos ministros comunistas logo após sua ascensão à chefia de governo, sacrificando a ideologia no altar da governabilidade. Déjà vu?

Burguês de província, da France profonde, com a formação literária e humanista típica de seus pares, cita de memória vários escritores seus compatriotas de diferentes épocas, se diz o último dos grandes presidentes franceses — pois, vaticina depois dele virá, se não o dilúvio, apenas financistas e contadores. Lamenta o assassinato da idéia socialista, de quem foi o primeiro chefe de governo gaulês em muito tempo (bem depois do judeu Léon Blum, de quem ganha um retrato como presente de aniversário). É pungente com sinceridade em seu terror diante da decadência física e do mysterium magnum da morte, diante da qual todo poder e todo materialismo dialético é impotente. O jovem jornalista, por sua vez, se deslumbra com essa relação íntima com o poder encarnado, que se torna subitamente um pai ou um quase amigo — desses que, drummondianamente, secretamente influem na carne e nas paixões. Mitterrand comenta-lhe até as namoradas, dá conselhos: afinal, estão irmanados nessa Agincourt da construção do legado de Mitterrand, que se afina (se afinaria) com “o sonho comunista enraizado na Humanidade”, com a luta por “aqueles que sofrem”. O ainda presidente marca com uma pausa a admoestação de seu entrevistador esquerdista, de que “num mundo onde o dinheiro só gera dinheiro, a luta de classes retornará com mais força do que nunca”.

Narciso do poder, sua dimensão pequeno-burguesa o leva a maravilhar-se com a própria significação histórica: lembra que, dentre os governantes franceses, só Napoleão governou tanto tempo quanto ele. Seduz o entrevistador para a grande obra de construção de sua imagem pública, cala sem consentir sobre seus erros. Humano, rebela-se contra a degenerescência de seu corpo, as marcas do tempo e a fragilidade física: nu, concreta e metaforicamente, precisa de ajuda do repórter até para levantar-se de uma banheira.

Dá muito o que pensar. Mitterrand viveu a frustração de ver que o sonho socialista era só isso mesmo, sonho, irrealizável, e esteve no centro de vida política de uma ex-potência em pleno nadir da esquerda, quando começava a desmoronar o edifício erguido em anos de lutas de trabalhadores contra a exploração desumana desde a Revolução Industrial. Hoje, o próprio conflito capital-trabalho parece transcendido, pois supostamente todos são capitalistas, constituindo forçadamente sociedades para receber o pagamento de seu trabalho, até porque não há emprego, e os encargos sociais são intragáveis e ninguém quer pagar renda fixa a ninguém quando o lucro, além de variável por definição, é cada vez mais incerto. Quando o equilíbrio fiscal vira anátema de governo e os países antes em desenvolvimento se tornam mercados emergentes, os governantes ficam obsoletos, um banqueiro de investimentos dá conta do recado muito melhor. No fundo, quem preside a nação são os Presidentes do Banco Central, ágeis executivos com procuração do FMI, e não literatos grand seigneurs refestelados em poltronas do Eliseu.

Mitterrand assistiu de camarote à ascensão do sufrágio universal como moeda de troca contra os fascismos e o comunismo, mas não viveu para ver a decadência atual da democracia representativa, que chega no mesmo instante de seu apogeu. Antes, havia voto censitário, e senhoras não botavam o delas na urna. Nos primeiros anos depois que se democratizou o pleito, os populares recé-guindados à cidadania plena ainda elegiam representantes entre os membros da elite, mais afeitos às complexas tarefas da administração pública. Agora, elegem a si próprios, Lulas, Evos Morales, analfabetos, índios, com quê resultado? Parecem agora apenas babar de avidez, porque podem comer com suas próprias mãos gordas fatias do butim público. Nem o jacobinismo mais radical iria tão longe: o próprio Lênin era um grande cientista político de origens aristrocráticos que só renunciou à teoria revolucionária pela prática revolucionária, mas nos legou seu Imperialismo – Etapa Superior do Capitalismo e outros clássicos, lembrando que sem teoria só agitação sindical que em nada altera a essência do jogo da exploração capitalista. Marx criticava a fetichização dos trabalhadores, no que tinha razão: até por viver alienado do seu trabalho, o operário médio não é nada invejável: trepa sem camisinha com putas baratas, enche a cara de cachaça prá relaxar e embolacha a mulher. O verdadeiro socialismo consiste em transformá-lo num burguês como Mitterrand, citando Rimbaud, apreciando finas iguarias etc. E o que dizer da arte proletária? Funkeiros, DJS, popuzudas, intelectuais orgânicos da multinacional narcotraficante perdendo a linhae ganhando cada vez mais grana, enfim, uma profusão de idiotas rodriguianos, exultantes com a própria estultice e o dinheiro que não pára de jorrar. Do outro lado, supostamente legal, Robertos Carlos ajeitando meiões sem nenhuma emoção, indiferentes ao sofrimento de seus compatriotas, pois já venceram, e a lógica hoje é The winner takes all, e não renda para que muitos possam viver com um mínimo de decência e consumir a riqueza produzida. O que fazer? Quo vadis, Domine? A morte de Mitterrand está viva — e apavora.

Wednesday, July 12, 2006

 

A Filha do Homem Me Arrepia....

All Around

Bebel Gilberto

After all, all I have in my mind
Is just silence all around
A thousand times I have tried to find
Pieces of dreams, visions and sounds
And then I pray for better days
Do you know how it is without anyone
Do you know anyone?
Don't let it go
Never forget that when I think of you
You're not alone
After all, all I have in my heart
Are the pieces, that I found
Shades of blue, swimming in the moon
Counting the stars all aroundI say a prayer for better days
Do you know how it is without anyone
Do you know anyone?
Don't let it go
Never forget that whenI think of you
You're not alone
Do you know how it is without anyone
Do you know anyone at all?

Monday, July 10, 2006

 

Beckett (Thanks Api)

Samuel Becket wrote:

It is indeed becoming more and more difficult, even senseless, for me to write an official English. And more and more my own language appears to me like a veil that must be torn apart in order to get at the things (or the Nothingness) behind it. Grammar and Style. To me they seem to have become as irrelevant as a Victorian bathing suit or the imperturbability of a true gentleman. A mask. Let us hope the time will come...when language is most efficiently used where it is being most efficiently misused. As we cannot eliminate language all at once, we should at least leave nothing undone that might contribute to its falling into disrepute. To bore one hole after another in it, until what lurks behind it—be it something or nothing—begins to seep through; I cannot imagine a higher goal for a writer today.

 

Zidane-se Quem Puder

O Abidal e sua moto que união infeliz na lateral esquerda.... Foi a Copa da cera. Tinha que ter cera no ouvido para não ouvir o Galvão ou o Paulinho Boca de Cantor, e todo mundo segurando o resultado fazendo cera. Agora já passa da hora, que venha o Vasco, e cá aposto nas nossas peraltices. Copa Náfrica do Sul? Bafana Bafana? Sei não, maneiro é o Black Mambazo a nos fitar no embate como o touro fitava Manolete. Ou macarrão que sem óleo vira tolete. Nada, nada, a não ser o abusado Cristiano Ronaldo, com seu nome de cantor de churrascaria, Joe Cole (cheers old mate!) e Cannavaro (custou a desencantar...) e Zizou que sifu como Cafu, mas jogou com Maladou... Imperativo é zidanar, como não zi danou o Murat da novela... Turco com nome de paulistano....

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