Wednesday, November 12, 2008

 

Fukuyama, Conversão, Desejo de Reconhecimento, Hegel, Reich der Freiheit, Esquerdas, Thymos, Exumação do Japonês, Je (Ne) Suis Jesuíta, o Fim, e o Dia

A História acabou? Não. Até os EUA estão estatistas. Ob-amados. Ex-tado. E os chineses capitalistas. Confuso? Ora... Vamos ver se ela acabou ou se isso aqui é um espasmo do que teclei há dois segundos. Hoje é o passado do futuro.

Francis Fukuyama (escolhi ele aleatoriamente, pode ser você o leitor, como veremos) tem muito em comum com protagonistas de movimentos como o dadaísta, beatnick, hippie, etc... Como seus predecessores, ele é mais um incompreendido. Vários artigos foram escritos no século passado sobre seu ensaio questionando – e não afirmando - se a história estaria chegando ao fim. Acho que 90% dos resenhistas e “editoriadores” não devem ter lido o ensaio original que deu no livro. O ensaio era chamado “The End of History?” (acompanhado por esse importante ponto de interrogação), e saiu na obscura The National Interest. Obscura em todos os sentidos, mas isso não vem ao caso. Mas aí o Francis (hmmm) deu asas à sua sofisticada e controvertida obra, que de ode insípida ao neoliberalismo tem pouco, na verdade.

Comecemos por essa conceituação sobre o caráter finito da história. Para os mais incautos e ingênuos, deve ser dito que até hoje Fukuyama não prevê o fim de eventos significativos, das ocorrências que constituem a própria fábrica da História.

Fala-se aqui sobre a finalidade (um duplo, por favor) da História.

No mundo ocidental, esse conceito tem sua origem na idéia judaico-cristã, cuja razão de ser está intimamente ligada ao “fim dos tempos”, ao apocalipse. Ainda que você não goste do cheiro de napalm de manhã, sabemos que a dissociação filosófica entre o religioso e o científico, o resgate do conceito de finalidade da história, deu-se no Iluminismo, principalmente através de Turgot e Condorcet – no campo das idéias. Este inclusive delineou uma história universal do homem em seu “O Progresso da Mente Humana”, enumerando dez estágios distintos. O último seria caracterizado por igualdade de oportunidade, liberdade, democracia e educação universal (grifo meu).

Kant também sugeriu depois tal conceito. Para ele, “a história do mundo nada mais é do que o progresso da consciência da liberdade.” Isto é, Kant via um propósito final inerente no auto-questionamento do homem sobre seu destino e potencialidade. Tal propósito se reflete no progresso cívico e científico da humanidade.

Mas Fukuyama se ampara sobretudo em Hegel. Antes de Zizek. Nesse ponto ele também é incompreendido. Ocorre que Hegel, no mundo de idéias anglo-saxão, era visto como um apologista reacionário da monarquia prussiana. Até Marx (hegeliano também sim sinhô!) dizia que Hegel era um entusiasta da burguesia (sic). A visão de Marx é importante, como sempre. Assim, achavam que Hegel queria preservar boa parte das atividades econômicas longe da rede do estado e nas mãos da burguesia. Ora, mas essa antagonizava com o absolutismo na época. Era a Zona Oeste de então. O cara então tava com o mocinho e não com o bandido. Se bem que nunca se sabe...

Basta dizer que para Hegel, a culminação do processo histórico – daí o interesse de muitos e também o desinteresse de outros tantos por suas idéias – viria com a realização de conceitos universais como liberdade e igualdade. E o estágio final viria quando atingíssemos um estado de total auto-consciência (sic). Pronto. Fim de papo no Maraca. Psicanálise, ciência política, filosofia e economia numa grande suruba. Essa orgia denota-se em termos que roubaram do estudo da alma, filosófico, para “outorgarem” a outras ciências. Conceitos como “crédito”, “acreditar”, “crença”, e “confiança” tem uma raiz pecuniária que foi jogada no colo até da psicanálise. Que agora devolve a peteca pra economia nas pesquisas de confiança do consumidor. Muito Nobel de economia recente foi concedido a trabalhos relacionados ao comportamento de agentes econômicos.

Assim o marxismo – reflitam bem – está nessa mesma corrente teleológica. Ou seja, o marxismo tem um propósito final que visa atingir a plenitude de igualdade sócio-econômica. Dentro desse prisma, seria arriscado criticar o trabalho de (não) marxistas. O comunismo representa não um estágio superior à essa “democracia liberal” que mal se sustenta mundo afora, e sim o mesmo estágio. Pois contribui para a difusão da idéia de liberadade e igualdade hegeliana. Ambos arremedos ideológicos, é claro, oriundos da Revolução Francesa. O que já estava mais do que claro, a essa altura.

O fracasso daquele comunismo tosco e fora de moda, nos faz ponderar se a história universal concebida por Hegel não seria na verdade mais profética do que a sua versão marxista atual. Falamos da auto-consciência. E aí ela se confunde com o individualismo. Uma pena. Mas Marx, como veremos no final – com trocadilho – tem a melhor resposta para isso. Jung pensou no inconsciente coletivo, mas ele nos afastaria do bem-estar, dentro desse prisma. A inconsciência seria a antítese de Marx e Hegel. O consciente “in” no caso está “out”. Portanto a mola mestra dessa democracia liberal meio apatetada que temos por aí está fortemente associada ao conceito da auto-consciência absoluta de Hegel.

A isso soma-se também um desejo de “reconhecimento” no plano abstrato (por vezes espiritual), o thymos platônico, que impulsionaria o homem coletivamente. Como falamos aqui num plano não-normativo, a hipótese hegeliana (ou fukuyamense, ou a sua, e não a minha) parece curiosa. No bom sentido. O número aparente de escolhas que um país tem para determinar sua organização econômica e política diminuiu através dos tempos. Não há nenhuma ideologia, fora o embate dialético de sempre, que possa ter uma pretensão mais universalista. Mormente acompanhada do imanente ou religioso.

O conceito da União Européia aponta para esse caráter de observar a “finalidade” da história. Até mesmo a expressão de Lula, “Nunca na História do País....”, é hegeliana. Algo então já nasceu, sob o conceito de nosso presidente, fora do escopo histórico e ali permanece. E ele é (de um partido) de esquerda.

Quanto a essas porradas que observamos e inssurreições nacionalistas em territórios menores, skirmishes, não passam do que Alexandre Kojève chamava de “bonapartismo-robespierriano (sic) que obrigou a Europa pós-napoleônica a acelerar a eliminação de sequelas anacrônicas de seu passado pré-revolucionário”. Ou seja, temos aqui e ali um surto de inconsciência ufanista, mas é parte do estágio natural rumo à auto-consicência pós-histórica.

Voltando de novo. Antes da derrocada do comunismo tosco, vestido de Ducal, tivemos a derrubada de vários governos de direita na Europa nos Anos 70. A coisa é cíclica, mas como PT e PSDB, todo mundo é da Rua Maria Antônio – ou seria Antonieta? Fazem o revezamento de bastão. Uns acham que isso basta. Outros também, mas com um diferente significado e conotação para a palavra.

Voltando ao fim da história, o título do livro de Fukuyama é “O Fim da História e o Último Homem”. Esse cara aí vem a calhar. O desejo de reconhecimento, por humanos e nações, vem acompanhado pelo orgulho, paixão, raiva e violência. Características do ser humano e do animal irracional (na nossa malta temos alguns de tal espécie representados). Isso é o próprio combustível do processo histórico.

O argumento engloba dois tipos de “primeiro homem”. Um hobbesiano, que, preocupado com o mundo cão, e motivado por um desejo racional de auto-preservação, acabou dando no “último homem” de hoje. Este, por sua vez, seria complacente e absorto em si mesmo. Segundo George Gilder, essa espécie de “primeiro homem” tem na sua “busca da felicidade” a falha fatal do mundo ocidental de nossos dias, pois sua morosidade torna-o incapaz de defender-se dos assaltos relativistas. Pois o relativo é um absoluto em si, conceitualmente falando.

Mas temos também um “primeiro homem” nietzschiano, que se arrisca mortalmente em nome do “reconhecimento” (palavra recorrente no hegelianismo - Freud gostava muito) e respeito por suas idéias.

Então o “último homem”, cidadão desse reino liberal democrata final, é segundo Fukuyama – pasmem – “um homem vazio e quase sem razão de ser”, pois seus desejos, ideais e busca já teriam acabado. Será? Quando vejo o Berlusconi na TV, acho que não. O problema aí é originário do conceito de Nietzsche de que a (então) moderna democracia não representava a auto-realização e transcendência (self-mastery) dos que eram escravos (sic), e sim a própria vitória total (sic) dos escravos, trazendo consigo uma espécie de moralidade escravizada. Revolução Francesa? Sei lá...

Com isso apóia-se – prescritivamente - uma política séria e real de direitos humanos, que passa pelo ambientalismo tonificado, algo impensável num regime ancorado na real politik ou de emergentes botando as manguinhas pra fora. Quando é o caso, sempre se fala em aumentar o orçamento militar, comprar submarino nuclear etc... Claro. Pois a ironia final de toda essa conversa está presente na conceituação marxista da luta de classes. Estas lutavam entre si por um “domínio” (mais um duplo, por favor). Assim, nos lembra Kojève, havia o que Marx definia como Domínio da Necessidade (Reich der Notwendigkeit) e outro situado além (sic) que seria o Domínio da Liberdade (Reich der Freiheit) no qual os homens não lutariam e trabalhariam o mínimo possível. Reich pode ser domínio, fica mais poético e significativo.

Os espiritualistas devem pensar nisso e muito. O pessoal das filosofias orientais devia se orientar também. Sem ironias. Zen, Tao e Vedas. Vemos que Marx e Hegel apostavam no além e numa liberdade que poderia vir da auto-consciência, no que concerne a “finalidade” histórica. O materialismo dialético pressupõe um desfecho igual ao religioso. Seria pós-histórico, pois previa o fim de algo, no caso o capitalismo, ou estado (outro duplo, por favor, o último) das coisas atuais. O religioso pragmático contando seu dízimo (a César o que é de César), e o ateu espiritualista, pensando no além.

Se não é o fim da história para uns, é o fim da picada (ok, mais um duplo) para outros. O que é a mesma coisa.

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